Uma ação judicial inédita questiona o sistema tributário brasileiro no STF. A Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco), com apoio da Oxfam Brasil e do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu), protocolou nesta terça–feira (3/3), no Supremo Tribunal Federal, uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) em que questiona a regressividade do sistema tributário brasileiro.
Baixe aqui a ADPF protocolada no STF sobre a regressividade do sistema tributário brasileiro.
A ADPF, elaborada por Eloísa Machado, professora de Direito da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP) e advogada do CADHu, se posiciona contrária ao atual sistema tributário. Segundo a argumentação, o atual sistema cobra proporcionalmente mais de quem ganha menos, promovendo, assim, desigualdade social.
De acordo com o artigo 3º da Constituição Federal, constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
- a construção de uma sociedade livre, justa e solidária;
- a garantia do desenvolvimento nacional;
- a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais;
- e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Sendo assim, a ação que questiona sistema tributário no STF pede que o STF determine que os poderes Legislativo e Executivo orientem mudanças pela igualdade tributária para cessar essa inconstitucionalidade do sistema tributário brasileiro.
Confira a íntegra do documento.
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“O debate sobre a reforma tributária no Congresso Nacional tem focado apenas na questão da simplificação da tributação do consumo, não tocando na tributação da renda e do patrimônio, o que não é suficiente para corrigir o sistema tributário e recuperar a economia brasileira. Por isso apelamos ao STF para que a Corte determine que a Comissão Mista adote o parâmetro da igualdade material tributária como referência para a elaboração do novo texto”, afirma Charles Alcantara, presidente da Fenafisco.
Leis e normas vigentes sustentam a regressividade do sistema tributário brasileiro porque impõem maior carga tributária sobre o consumo e não sobre a renda e o patrimônio. “A regressividade, que se opõe frontalmente a um dos mais caros princípios constitucionais tributários – o da capacidade contributiva – não apenas se mantém incólume como se agravou desde a promulgação da Carta Magna”, observa Alcantara.
Os pedidos da ADPF ao STF
- Reconhecer que a regressividade do sistema tributário brasileiro cria um estado de coisas inconstitucional;
- Determinar ao Congresso Nacional e ao Poder Executivo a elaboração de uma proposta de reforma constitucional tributária que resulte num sistema tributário progressivo em substituição ao atual, profundamente regressivo;
- Que seja feita uma reavaliação das renúncias e desonerações tributárias concedidas, para medir seu impacto na regressividade e sua a eficiência no estímulo aos respectivos setores produtivos.
“Como há uma Comissão Mista para analisar propostas de reforma tributária, a ação pede que seja dada uma medida liminar para, desde já, impor ao Congresso Nacional o dever de corrigir a regressividade do sistema tributário brasileiro”, comenta a advogada da ação, Eloísa Machado.
Eloísa explica que o STF tem se pronunciado em uma série de julgamentos que consideram tributos isoladamente. É o caso, por exemplo, da progressividade de alíquotas do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD) e do Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU).
“O Supremo Tribunal Federal tem se debruçado sobre a isonomia nas relações tributárias. Porém, este é um valor a ser buscado não só na concepção e aplicação de um determinado tributo, mas de todo o sistema”.
Alíquotas favorecem os mais ricos
Em 1988, por exemplo, o Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) taxava mais progressivamente as altas rendas. As alíquotas chegavam a 45%. Hoje, no entanto, o IRPF tem uma alíquota máxima de 27,5%. E essa alíquota não incide sobre os lucros e dividendos recebidos por pessoas físicas, reduzindo-se a um imposto sobre salários.
Por outro lado, a hipertributação sobre o consumo reforça a condição do Brasil de um dos países mais desiguais do mundo, uma vez que onera desproporcionalmente os mais pobres, em favor dos mais ricos. Atualmente, cerca de 50% da carga tributária do Brasil são de impostos sobre o consumo. Enquanto isso, na média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), essa carga é de 32,4%.
No Brasil, o IRPF é dividido em cinco faixas de renda agregando pessoas com níveis muito diferentes de renda em um mesmo grupo. Com isso, cria-se ainda mais desigualdades, já que quanto maior a renda em salários mínimos maior a participação da renda isenta.
Por exemplo: quem declara renda superior a 240 salários mínimos mensais chega a ter 70% da renda isenta e não tributável. No entanto, aqueles que ganham entre três e cinco salários mínimos têm pouco mais de 10% da renda isenta e não tributável.
Reforma tributária mais justa é urgente
“A reforma tributária é urgente, necessária e estruturante. O conjunto do sistema tributário atual é inconstitucional. É preciso trazê-lo para a vigência da Constituição, tornando-o mais justo para todos os brasileiros”, afirma Katia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil, parceira da Fenafisco na ADPF.
“Tirar o Brasil do ranking dos países mais desiguais do mundo é viável e depende de escolhas políticas que são feitas por governantes, legisladores e sociedade. Para isso, o sistema tributário é ferramenta fundamental. É hora de priorizar uma reforma tributária que acabe com privilégios e injustiças.”
Conheça as 5 propostas tributárias para reduzir as desigualdades da Oxfam Brasil.
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