Esse calendário é resultado de um projeto muito especial para nós. Ele nasceu do desejo de dar visibilidade aos milhões de brasileiros e brasileiras que mais sofrem com as gritantes desigualdades em nosso país. Fomos a campo fotografar diferentes pessoas de alguns dos grupos mais afetados pelas desigualdades, escutar suas histórias e conhecer seus sonhos. Ao longo de cada mês deste calendário, retratamos essas histórias.
Samantha Vieira de Melo, 38, nasceu em Pernambuco e há três anos fez sua transição em São Paulo. Desempregada, vive em um centro de acolhida para mulheres trans da Prefeitura da capital. “Muitas vezes as pessoas não se aproximam achando que somos prostitutas ou bandidas, mas quando nos dão oportunidade, descobrem que somos seres humanos, temos sentimentos.”
Quando o fotógrafo Joellington Rios, 20, chegou ao Rio de Janeiro, em 2018, ainda não tinha a dimensão da relação entre racismo e desigualdade. Joellington morava no quilombo Jamary dos Pretos, no Maranhão, e lá não tinha enfrentado ainda essas questões. “Hoje, como jovem negro morando no Rio, sinto essa desigualdade todos os dias. Se eu fosse rico, pouco mudaria, porque continuaria sendo visto como negro.” VEJA O VÍDEO
Ana Carolina Martins, 31, nasceu no Capão Redondo, São Paulo, e hoje tem uma produtora audiovisual especializada em cultura da periferia. “Toda desigualdade é uma humilhação social, uma forma de forçar alguém a se curvar para outro. É algo muito perturbador, porque a desigualdade tem a ver com a liberdade. É tudo tão desigual, que todos nós nos tornamos escravos. Não somos pobres, somos empobrecidos.” VEJA O VÍDEO
Francisco Passos, 47, mora em Cajaíba, São Paulo, e seu maior sonho é ter uma casa própria para morar. “Quero a minha casa. Os bancos só querem emprestar para quem não precisa. Isso alimenta a desigualdade, a meu ver. Por isso me juntei ao pessoal da luta por moradia porque a gente tem direito à moradia, todos têm. Tem muita terra parada por aí, com imposto atrasado, e um monte de gente precisando.”
Valdinei Ribeiro, 33, nasceu em São Paulo e trabalha como ator e bailarino de danças populares na periferia da cidade. “Converso muito sobre questões de raça, como somos excluídos pela cor da pele, por ser preto. Quais são os acessos que nós da periferia temos a espaços como o Teatro Municipal? No Brasil, há quem diga que isso é um exagero, que somos todos iguais, mas na prática não é assim.”
Leonardo Luiz, 24, nasceu no Guarujá, São Paulo, e foi para a capital tentar encontrar um local para morar. Atua no movimento por moradia de Cajamar, Grande São Paulo. “Minha infância, como a de todos os jovens de periferia, sempre foi uma luta contra o racismo, que nos atrapalha socialmente. Tive que parar de estudar, porque precisava trabalhar. Tem sido uma caminhada bem difícil. Mas a gente continua na luta.”
Ednusa Ribeiro, 42, nasceu e vive na Vila Progresso, São Paulo. Lidera grupo de mulheres empreededoras pretas e promove eventos. É funcionária pública e mãe de dois filhos. “Um transporte de qualidade ajudaria muito às pessoas a terem uma qualidade de vida melhor. Levo quatro horas diariamente para chegar ao trabalho. Isso prejudica nosso direito de ir e vir.” VEJA O VÍDEO
Moradora da favela da Maré, no Rio de Janeiro, Luciana Barros, 27, é estudante de dança na UFRJ e faz estágio em Artes Cênicas. “Se eu fosse branca, minha vida seria bem diferente, com certeza. Não passaria por tudo que passei por ser negra. Para ter uma aceitação, eu diariamente tenho que fazer as pessoas entenderem que negro também é bonito, que negro também tem coisas boas para mostrar.” VEJA O VÍDEO
José de Arimatéia Paiva Nunes, 42, é de Recife, Pernambuco, e veio adolescente para São Paulo. Trabalha como pedreiro e mestre de obras em Osasco. “Não vejo igualdade no Brasil, somos milhões de habitantes e apenas alguns são donos de quase toda a riqueza. Tanta casa por aí e a gente pagando aluguel. Por isso quero deixar um legado para minha filha, uma casa neste bairro que ajudo a construir.”
Aliny de Queiroz, 25, nasceu no Piauí e veio para São Paulo em busca de uma vida melhor. Seu sonho é voltar a estudar e conseguir uma casa para morar. Está desempregada e mora em uma ocupação em Cajamar. “Eu luto por sobrevivência, porque nosso país não tem muita oportunidade. Não tem emprego. Mas a gente está lutando, a gente faz o que for preciso para estar de pé.”
Roseane dos Santos, 25, veio da Bahia para São Paulo aos 15 anos. Com três filhos, abandonou os estudos. Sobrevive há 4 anos vendendo produtos no trem. “Eu acho que deveriam dar mais atenção para as mulheres. Principalmente mulher de periferia, negra… essa então já nasceu tendo que ser duas vezes melhor. Ou a gente mata um leão por dia, ou esse leão vai te matar!”
Thiago Silva, 32, mora na Favela da Maré, no Rio de Janeiro, é formado em Relações Públicas e trabalha como técnico em farmácia. “Estudava numa faculdade na Zona Sul e quando me perguntavam onde morava, respondia: “Bonsucesso”. Mas na verdade, era Favela da Maré, que é do lado. Se eu falasse “Maré”, teria um impacto negativo. As pessoas não estão acostumadas a ver um favelado dentro de universidade.”